Há muito o que conhecer e desfrutar pelas rodovias argentinas, e confesso que por aqui nós temos ficado encantados com as belezas que encontramos no caminho. Estamos no norte da Argentina, em Tucumán, uma província que estamos percorrendo um pequeno pedaço que é atravessado pela mítica Ruta 40. E exatamente próxima a essa parte de Tucumán estão as Ruínas de Quilmes.
Nós estamos na estrada há mais de um ano e recorremos boa parte da Argentina conhecendo lugares surpreendentes, passando por povoados lindos, lugares turísticos, paisagem de rios, mares e montanhas. Cada lugar com sua própria história e com sua cultura particular e às vezes com histórias de superação que nos enchem de orgulho e que nos fazem acreditar num mundo mais humanizado. Umas dessas histórias conseguimos conhecer visitando o Museu das Ruínas de Quilmes na província de Tucumán.
Nesse artigo você vai ler sobre:
O museu
Ruínas de Quilmes
Um povo inspirador
O museu
Me arrisco a dizer que foi um dos museus mais completos sobre os povos originários do qual tivemos acesso até o momento. Havia muitas peças bem preservadas e outras detalhadamente restauradas. Além disso, o museu conta com tradução para o português, o que não é muito comum por aqui. As peças ficam todas dispostas em vitrines bem projetadas para melhor exposição e preservação dos materiais e ao mesmo tempo nos dão a sensação de proximidade e intimidade com a história do povo Quilmes.

Na entrada do museu tem uma grande e didática linha do tempo que remonta a história desde os homo-sapiens passando por diversos períodos até os dias de hoje. Essa linha do tempo fica impressa numa parede imponente como um painel com ilustrações e dados históricos nos faz passear no espaço e no tempo.
Percorremos pela parte das manufaturas como cerâmicas e ferramentas que os Quilmes produziam e os detalhes das peças eram enaltecedores. Aprendemos também que eles derretiam ferro para fazer algumas armas e ferramentas como por exemplo um tipo de machado.
Na última sessão do museu estavam disponíveis caixas interativas com fone de ouvido e que nos contavam um pouco mais sobre os detalhes de como os Quilmes viviam. Eles eram um povo muito unido e sua cultura era fortemente ligada à terra, à caça e à agricultura.Cada caixinha interativa nos revelava um pouquinho de sua história.

Não existe uma definição exata de quando e como os Quilmes chegaram nos Valles Calchaquíes, alguns dizem que eles foram expulsos pelo império Inca, devido a grande expansão do império na região norte do Chile. Assim eles chegaram na região dos Valles Calchaquíes e se estabeleceram alí. Por outro lado, muitos pesquisadores rejeitam essa teoria, pois afirmam que os incas já estavam nos Valles Calchaquíes quando empreenderam a conquista da região central do Chile, mas não há evidências arqueológicas suficientes que confirmem esses fatos.
Os Quilmes também se destacaram por sua valentia, pois resistiram à colonização espanhola por mais de 100 anos até, infelizmente, serem dominados e transferidos para Buenos Aires em 1667. Mais de 2000 pessoas foram obrigadas a caminhar mais de 1500 quilômetros a pé, muitos morreram de fome, de doenças que pegavam dos europeus até chegarem ao Rio del Plata onde hoje é a cidade de Quilmes. Os poucos que ficaram em Tucumán foram escravizados e tiveram seu modo de vida usurpado.
O museu também conta com uma sala para exibição de vídeo, e essa parte nos deu um nó na garganta. O vídeo conta a história dos Quilmes desde sua chegada na nos Valles Calchaquies, das lutas contra os colonizadores, até os dias de hoje e como os descendentes diretos e indiretos vivem nos dias de hoje. Nossos olhos ficaram cheios de água com a história forte e a mensagem que quiseram nos passar.
Ruínas de Quilmes
Finalmente chegou a hora de conhecermos as ruínas. Logo na entrada do sítio arqueológico já podíamos enxergar, mas agora estava bem perto. Encaramos aquele lugar como sagrado, com o máximo de respeito que podíamos, ficávamos refletindo sobre tudo que vimos no museu e estar alí onde eles viviam cotidianamente era um sensação difícil de descrever, pois estávamos sobre os resquícios restaurador de um povo que só queria paz e por vezes foi atormentado pela ambição dos que buscavam a guerra imposta pelo seus sistema imperialista.

Começamos andar de uma lado para o outro admirando aquelas construções de pedra que serviam como casas, armazéns, santuários e notamos o quanto os Quilmes eram engenhosos e ousados. O conjunto de construções é surpreendentemente grande e acredito que desafiante para a época, pois a maior parte da construção foi realizada numa grande elevação natural aos pés de uma grande montanha. E mesmo assim as edificações na parte alta possuem platôs bem definidos e seguros que resistem até os dias de hoje.

Fomos subindo cada etapa da construção por uma pequena trilha que ziguezagueava a cidade, lá de cima conseguimos ter uma ideia maior da dimensão de tudo que os Quilmes construíram.
Um povo inspirador
Sempre quando visitamos lugares como as Ruínas de Quilmes ficamos pensando como seria esses mesmos lugares se não houvesse as interdependências externas dos colonizadores europeus, se o seu modo de vida fosse preservado, se sua cultura tivesse evoluído segundo suas características e sabedoria adquiridas pelo seu povo. Bom, nunca iremos saber essa resposta, mas penso que teríamos um respeito muito maior pelo meio-ambiente e por tudo que a natureza nos proporciona.

Visitar as Ruínas de Quilmes nos fez entender um pouco mais sobre a cultura dos povos originários e o quanto sua luta pela sobrevivência foi e é inspiradoras para os dias de hoje, suas tradições e cultura nos mostraram a importância de viver em comunidade construindo muito além do que era possível para época. Foi uma linda experiência viver, mesmo que por alguns instantes, as histórias heróicas e dramáticas de um povo tão forte e inspirador.